AS OPALAS DE PEDRO II ENCANTAM O MUNDO E O PROJETO QUE QUER REVELAR SEU “DNA”
- Revista Sapiência
- há 5 horas
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Imagine uma joia que parece capturar o universo em seu interior! Lampejos vermelho, laranja, amarelo, verde, ciano, azul e violeta dançam sob a luz como se estivessem vivos. Esse mineral existe — e nasce no interior do Piauí. Trata-se da Opala de Pedro II, considerada pelos especialistas como a mais bela gema da natureza. E agora, um esforço coordenado entre cientistas, governos e artesãos quer fazer dessa raridade um motor de desenvolvimento sustentável e inovação científica.
A opala é uma gema (atual termo para pedra preciosa) fascinante, composta por dióxido de silício hidratado, ela é conhecida pelas suas cores iridescentes — o chamado “fogo ou jogo de cores” — dá a sensação de que está viva, acesa, brotando labaredas coloridas. O que diferencia a opala piauiense das demais é sua dureza e resistência, características que a tornam única no planeta.
Apesar de sua beleza e potencial econômico, o Brasil representa apenas 3% da produção mundial de opalas — e toda essa produção vem de Pedro II, cidade com pouco mais de 38 mil habitantes, localizada no norte do estado do Piauí. Mesmo assim, boa parte da extração ainda é feita de forma primitiva, rústica e artesanal, com garimpeiros atuando sem maquinário ou apoio técnico, como se estivéssemos nos primórdios da mineração.
É nesse contexto que se organizou o Arranjo Produtivo Local da Opala – o APL da Opala, criado para estruturar e fortalecer toda a cadeia de produção desta gema, desde a extração até a produção das joias, passando pela pesquisa científica, inovação, sustentabilidade e inserção no mercado internacional.
H á registros pré-históricos quenianos e aborígenos australianos, de povos pré-colombianos no México e América Central, de diversas dinastias reais gregas, romanas, egípcias e europeias, com um rico acervo de estátuas de deuses, joias e coroas contendo opalas nobres.
Na milenar cultura chinesa, a opala é reconhecida como um amuleto de sorte e proteção, simbolizando pureza, esperança e boa sorte.
Na Índia, a opala é vista como um símbolo de beleza, associada ao planeta Vênus, regendo o amor, a harmonia e os relacionamentos. Além disso, acredita-se que as opalas trazem paz, tranquilidade, estabilidade emocional e estimulam a criatividade. Em algumas tradições indianas, a opala também é associada à deusa Lakshmi, que representa riqueza e prosperidade.
Os gregos acreditavam que a opala podia dar o poder da profecia a quem a possuísse, sendo associada aos deuses e à criação divina.
ATRAVÉS DAS CIVILIZAÇÕES
Para os beduínos do Saara, as opalas guardavam raios dentro de si, caídos do céu em tempestades.
O encantamento dos imperadores romanos pelas opalas foi traduzido pelo imperador Caio Plínio Segundo (23-79 d.C.), o “apóstolo da ciência romana”, historiador, naturalista, estudioso da zoologia, botânica, mineralogia e ourivesaria. É considerado o primeiro gemólogo do mundo, tendo declamado entusiasticamente:
“o vermelho apaixonado do rubi,
o verde magnífico da esmeralda,
o amarelo dourado do topázio,
o azul profundo da safira
e as ricas cores púrpuras da ametista
se encontram em uma única opala preciosa”.
Ao capturar o arco-íris em uma única opala nobre, os romanos acreditavam que as opalas eram a mais preciosa de todas as gemas, possuindo poderes que traziam proteção, pureza, felicidade, esperança e sorte.
As ocorrências de opalas nobres e opalas laranjas eram conhecidas dos Astecas (1320 a 1520). Na língua nahuatl destes povos pré-colombianos do México e América Central, a opala era quetza litzle pyolitli, a que muda de cor em movimento ou pedra pássaro do paraíso.
O “Deus Sol” dos Astecas, é esculpido numa opala cristal, laureado por chamas de ouro. Foi levada do México por volta do século XVI e se encontra no acervo do Chicago Field Museum.
As rainhas inglesas Elizabeth I (1533-1603) e Victoria (1837-1901), usavam luxuosos conjuntos de joias com opalas. Napoleão I, Bonaparte (1769-1821), presenteou sua imperatriz Josephine de Beauharnais com a maior e mais valiosa opala de sua época, a opala Burning of Troy.
Também há ocorrências de opalas nos Estados Unidos, Canadá, Honduras, Peru, Madagascar, Indonésia, Tanzânia, Turquia e Etiópia. Na Austrália, foram descobertas em 1870, e hoje respondem por aproximadamente 80% do mercado mundial desta gema.
No Brasil, no município piauiense de Pedro II, estão localizadas as principais minas produtoras de opalas nobres, enquanto a região do município de Buriti dos Montes produz opala laranja.
As ocorrências e depósitos de opalas localizadas na região de Pedro II foram alvo de diversas investigações científicas, apresentando excepcionais propriedades gemológicas, consideradas por muitos especialistas como as melhores opalas preciosas do mundo.
OPALA EM PEDRO II: TUDO É HISTÓRIA
E m Pedro II, a opala foi descoberta por volta de 1940, quando um agricultor, sr Simão, morador do Raimundo Monteiro, então proprietário da área onde hoje é a mina do Boi Morto, estava limpando um roçado entre a encosta da serra do Boi Morto e o vale fértil do rio dos Matos. Ao cavar o solo para o plantio, encontrou algumas pedras com “brilho furta fogo”, despertando sua atenção, coletou alguns fragmentos. Posteriormente, ao se deslocar para a cidade, mostrou o achado para o líder político da época, o prefeito e farmacêutico Lauro Cordeiro.
Este, aproveitando uma viagem para o Rio de Janeiro, a capital federal, levou um lote de pedras de uma beleza indescritível e mostrou numa loja na praia de Copacabana, onde foram identificadas como opalas. Ao retornar para Pedro II, comentou com o proprietário da terra, mas este não demonstrou interesse. Então apresentou a boa nova para João Pinheiro, comerciante de fios para tecelagem, que vislumbrou trabalhar com o minério, diversificando seus empreendimentos.
Decidiram arrendar a propriedade e iniciar a pesquisa e lavra de modo rudimentar, informal. Fizeram viagens para o Rio de Janeiro para prospectar mercado e negociar a incipiente produção.
Com o crescimento do negócio, contrataram um técnico para elaborar o projeto de pesquisa mineral, formalizando o primeiro registro de pesquisa mineral em Pedro II, com 40 hectares, nos locais Alma e Revedor, protocolizado no ano de 1944 e publicação no D.O.U. em 22 de janeiro de 1945, titulada em nome de Lauro Cordeiro Brandão. Posteriormente João Pinheiro adquire todos os direitos minerários da área e a explora por alguns anos.
Em 1958, Raimundo Daltro Galvão (“Mundote”) e Manoel Nogueira Filho (“Nogueirinha”) se associaram com João Pinheiro Santos na operação da mina. Investem e abrem novas frentes de serviço, aumentando a produção do garimpo, comercializada em São Paulo e principalmente no Rio de Janeiro, através do Sr. Nilson Lacerda Barbosa, diretor da “Empresa de Minérios Brasil Norte Nordeste LTDA” - EMIBRA.
Em 1962, área da mina do Boi Morto é arrendada pela empresa EMIBRA, que obtém o título de lavra na área do Processo № 6570/1962.
A foto registra oficialmente o início da exploração de opala na mina do Boi Morto exclusivamente por empresários de fora de Pedro II, tendo parceria comercial com operadores australianos, que adquirem toda a crescente produção de opalas. O Sr. Nilson faleceu num trágico acidente de Jeep ao retornar da mina para a cidade. Juntos, estavam os australianos Neville Gray Carter e Dag Bjorn Johnson que ficaram muito feridos.
Alguns meses depois, adquirem o controle total da mineração.
Com a internacionalização, finalizam as atividades rústicas e manuais. A exploração mecanizada tem início com o uso de dois robustos tratores Caterpillar D9, sob a supervisão técnica de geólogos e engenheiros de minas altamente especializados. Esse período marca o auge da produção de opalas, tanto nas frentes de lavra a céu aberto quanto nas galerias subterrâneas. Em 1984, aproximadamente duas décadas após sua chegada a Pedro II, os australianos encerram suas atividades e deixam para trás a lendária mina.
A produção de opala entra em declínio e retorna às atividades garimpeiras que se mantém até hoje, sem técnicas e equipamentos adequados e ausência de estudos geológicos e de engenharia, resultando em pequenas quantidades de opalas associadas a descobertas fortuitas, feitas acidentalmente.
UMA CURIOSIDADE, MUITAS FRENTES
A foto registra oficialmente o início da exploração de opala na mina do Boi Morto exclusivamente por empresários de fora de Pedro II, tendo parceria comercial com operadores australianos, que adquirem toda a crescente produção de opalas. O Sr. Nilson faleceu num trágico acidente de Jeep ao retornar da mina para a cidade. Juntos, estavam os australianos Neville Gray Carter e Dag Bjorn Johnson que ficaram muito feridos. Alguns meses depois, adquirem o controle total da mineração.
Com a internacionalização, finalizam as atividades rústicas e manuais. A exploração mecanizada tem início com o uso de dois robustos tratores Caterpillar D9, sob a supervisão técnica de geólogos e engenheiros de minas altamente especializados. Esse período marca o auge da produção de opalas, tanto nas frentes de lavra a céu aberto quanto nas galerias subterrâneas. Em 1984, aproximadamente duas décadas após sua chegada a Pedro II, os australianos encerram suas atividades e deixam para trás a lendária mina.
A produção de opala entra em declínio e retorna às atividades garimpeiras que se mantém até hoje, sem técnicas e equipamentos adequados e ausência de estudos geológicos e de engenharia, resultando em pequenas quantidades de opalas associadas a descobertas fortuitas, feitas acidentalmente.
O DNA DA OPALA
M as, espera aí… as gemas têm DNA?
Não exatamente como seres vivos — mas têm assinaturas geológicas únicas que as distinguem entre si. Os minerais se formaram ao longo de milhões de anos em condições muito específicas de pressão, temperatura, composição química e ambiente natural. Identificar essas características únicas, é como descobrir o DNA de um mineral. E isso é exatamente o que o APL da Opala em parceria com um projeto internacional quer fazer com as opalas de Pedro II.
Em junho de 2025, o município recebeu a visita inédita de pesquisadores do Gemological Institute of America (GIA) — o maior e mais respeitado instituto de ensino, certificação e pesquisa da gemologia mundial. A equipe, formada por especialistas de centros como Califórnia (EUA) e Bangkok (Tailândia), veio ao Piauí coletar amostras para realizar estudos das propriedades das opalas locais, com o objetivo de criar um banco de dados global sobre a origem destas gemas, algo como um “DNA mundial das opalas”.
A visita reuniu instituições como o IFPI, UESPI, FAPEPI, o Governo do Estado, prefeitura, empresários e produtores locais, somando esforços para transformar a opala em vetor de desenvolvimento. Pesquisadores como o professor Érico Gomes (IFPI) e a professora Lilane Brandão (UESPI), além de representantes da cadeia produtiva local como o ourives Antônio Mário, acompanharam a equipe do GIA nas visitas às minas e oficinas artesanais.
“Quando entendemos a formação da opala, poderemos certificar sua origem. Isso é fundamental para valorização no mercado internacional e combater fraudes”, explica o geólogo Brian Charles Cook, consultor da equipe do GIA e veterano no estudo de gemas ao redor do mundo.
“Estamos trabalhando com métodos avançados de análises mineralógicas para definir a caracterização gemológica e geoquímica das opalas da região”, explica Érico Gomes. “Com isso, conseguiremos autenticar e certificar a opala de Pedro II como genuinamente piauiense, mesmo que tenha sido comercializada há muitos anos, podendo informar até de qual garimpo ou mina foi extraída, o que vai valorizar ainda mais o nosso produto no mercado internacional.”
Além da parceria internacional, o APL também conta com o suporte científico da Universidade Federal do Pará (UFPA), que disponibiliza laboratórios geológicos e gemológicos especializados para aprofundar as análises das amostras coletadas, referência nacional na área, e peça-chave no cruzamento de dados para traçar com precisão o DNA da opala de Pedro II, reforçando a validade científica da descoberta. Além disso, a pesquisa geológica pode revelar jazidas ainda desconhecidas e reavaliar as atuais, fundamentais para um crescimento sólido.
Com o apoio técnico adequado, tecnologias apropriadas, formas mais eficientes, produtivas e sustentáveis de extração, o saber técnico se junta à experiência de quem trabalha no dia a dia. Esta é a missão da parceria do APL da Opala com a Universidade Federal do Ceará (UFC), Campus de Crateús, através do Projeto Mina Escola, desenvolvido pelos professores e alunos do curso de engenharia de minas. Para uma produção atual que ainda depende muito da sorte e do esforço braçal de garimpeiros, representados pela Cooperativa de Garimpeiros de Pedro II, esses avanços podem significar uma revolução.
A beleza da opala piauiense, ao que tudo indica, não está só nos olhos de quem vê — mas também nas minúsculas estruturas que só a ciência pode revelar.
O CETAM — Centro de Tecnologia e Artefatos Minerais de Pedro II
U Um marco importante do APL foi a abertura do Centro de Tecnologia, uma estrutura que estava inativa há quase 20 anos e que foi reinaugurada em junho de 2024 com o apoio da FAPEPI, através do projeto “O APL da Opala no CT Mineral Piauí: pesquisa, inovação e desenvolvimento sustentável”, e do CNPq, com o projeto “APL da Opala do Piauí – sustentabilidade do garimpo à joia”. O Centro agora opera como espaço estratégico de capacitação, experimentação e produção, oferecendo oficinas e cursos voltados à lapidação, design de joias, ourivesaria e fundição, trazendo inovações e novas tecnologias aplicadas para o setor.
“O CETAM é um espaço onde o saber tradicional se encontra com a tecnologia. Aqui a gente forma profissionais, transforma a opala em arte, dá valor à história de Pedro II contribuindo com a valorização do sentimento de piauiensidade”, afirma Antônio Mário, joalheiro e atual coordenador do centro.
“O Centro representa a valorização da população de Pedro II e o fortalecimento das relações entre os diversos agentes da cadeia produtiva da opala. Mais do que capacitar, promove a sustentabilidade social, incluindo o saber local na construção de um futuro economicamente justo e culturalmente rico para nossa região”, destaca a professora Dra. Lilane de Araújo Mendes Brandão.
A reestruturação do Centro foi pensada justamente para impulsionar a cadeia produtiva da opala de forma sustentável e inclusiva, conectando garimpeiros, artesãos, estudantes, pesquisadores e empreendedores. “É um símbolo da retomada da política pública voltada ao pequeno produtor mineral”, afirma João Xavier. “Ele materializa a missão da FAPEPI de transformar ciência em desenvolvimento.”
A gestão das atuais e das novas empresas da cadeia produtiva da joalheria que estão surgindo por toda a região é missão da equipe de professores do IFPI de Pedro II, liderada pelo professor Clayton Robson Moreira da Silva. Administração, vendas, estoque, marketing digital, empreendedorismo passam a fazer parte da profissionalização do setor.
“Estamos analisando as possibilidades de nos tornarmos uma incubadora de empresas para os alunos recém-formados nos cursos profissionalizantes e até de prestarmos serviços especializados para o mercado, além de fazermos os registros e patentes das nossas marcas e criações com as opalas”, segundo o professor Tiago Soares da Silva, do IFPI, especialista em propriedade intelectual.
Em um ano de funcionamento, o atual espaço do CETAM ficou pequeno para as metas do APL da Opala. “Quando abrimos os cursos, o espaço parecia enorme, mas hoje com o início dos cursos de lapidação, ourivesaria, artesanato mineral, design de joias e brevemente fundição de joias, gemologia e geoturismo, precisamos de um espaço maior para que os cursos possam ocorrer simultaneamente. Estamos semeando sonhos”, destaca Érico Gomes.
O CETAM neste curto período de funcionamento, já atrai a atenção de profissionais de todo o Brasil para Pedro II, tendo a missão de formar profissionais para a cadeia produtiva da indústria joalheira e tornar-se uma referência nacional para este segmento. A estruturação desse ecossistema — que inclui desde garimpeiros tradicionais até laboratórios de alta tecnologia — é o que sustenta a proposta do APL: lapidar o futuro de Pedro II com base no seu maior tesouro.
Como um grande resultado do trabalho da APL da Opala, junto ao CETAM, foi a formação da primeira turma do curso Técnico em Ourivesaria, em 2025, com apoio da FAPEPI do IFPI e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), com o objetivo de qualificar toda a cadeia produtiva da opala — desde o garimpo até a lapidação — agregando valor ao produto final e ampliando sua inserção no mercado nacional e internacional.

UM EFEITO ÓPTICO QUE HIPNOTIZA E ENCANTA!
A opala é a gema que mais fascina o homem, seduzindo olhares intrigados com sua rara beleza. O nome opala é derivado do termo upala, do sânscrito - língua sagrada dos antigos sacerdotes hindus - que significa pedra preciosa. A variedade dos seus lampejos coloridos é inigualável, sendo considerada pelos mineralogistas e gemólogos como a mais linda de todas as gemas do reino mineral.

O jogo de cores da opala preciosa foi revelado ao microscópio eletrônico como resultante de uma rede de difração natural, tridimensional, formada por um conjunto de esferas de sílica amorfa, regular e ordenado, que irá continuar crescendo até que esteja mais denso do que as partículas em suspensão. Então ocorre a precipitação das esferas, formando a opala (figura 1).
A opala nobre em sua forma mais bela, consiste de um empacotamento hexagonal ou cúbico de esferas perfeitas e iguais (figura 2).
Somente um empacotamento de esferas perfeitamente idênticas em tamanho, nas quais os espaços entre elas não sejam totalmente preenchidos pela sílica, admitem jogo de cores, influenciando na transparência, qualidade e beleza desta gema.
As esferas de sílica são opticamente transparentes, mas devido ao índice de refração das esferas ficar entre 1,435 e 1,455, muito maior do que o índice de refração da água, vapor ou ar, os quais podem preencher os interstícios entre as esferas, a luz poderá ser difratada na superfície dos interstícios, quebrando a continuidade óptica da luz, agindo como uma rede de difração óptica tridimensional (figura 3).
O jogo de cores da opala nobre depende de fatores como: diâmetro, uniformidade e alinhamento das esferas de sílica, ângulo da luz incidente, ângulo de visão e orientação da gema. O comprimento máximo de onda que pode ser produzido pela difração da luz na rede tridimensional das esferas é dado por 1,71D ≤ λ≤2,37D.
As opalas mais apreciadas e valorizadas, aquelas que apresentam flashs de cores espectrais com todas as cores do espectro visível, as cores do arco-íris (azul, verde, amarelo, laranja e vermelho), observadas em função dos diferentes ângulos de incidência da luz, possuem esferas de sílica com diâmetros entre 222 e 329 nm.
O cabochão, lapidação com o topo convexo, ressalta as cores do jogo-de-cores. Numa mesma posição, diversos ângulos de incidência da luz são vistos na sua superfície, exibindo toda a exuberante beleza das vividas variações de cores hipnotizantes das opalas preciosas.
SUSTENTABILIDADE: MUITO MAIS QUE UMA PALAVRA BONITA
U ma das críticas frequentes à mineração é o impacto ambiental e social que ela pode causar. E com a opala, não é diferente. O município de Pedro II, que se tornou conhecido mundialmente pela extração dessa pedra preciosa, também convive com os efeitos negativos do acúmulo de rejeitos da atividade minerária — um desafio que ameaça tanto o meio ambiente quanto a qualidade de vida das comunidades locais.
É por isso que o APL da Opala inclui um eixo específico de sustentabilidade, coordenado pela professora da UESPI, Lilane de Araújo Mendes Brandão. “A ideia não é apenas explorar, mas recuperar as áreas degradadas. Estamos desenvolvendo práticas de manejo que respeitem o meio ambiente e promovam justiça social”, destaca.
São iniciativas inovadoras voltadas à criação de um índice de sustentabilidade específico para os agentes da cadeia produtiva da opala. Essa ferramenta permitirá avaliar aspectos sociais, ambientais e econômicos de cada elo da cadeia, promovendo maior equilíbrio nas relações entre garimpeiros, artesãos, empreendedores e instituições. Com esse enfoque, busca-se não apenas tornar o setor mais justo e inclusivo, mas também fortalecer a qualidade e autenticidade das peças produzidas, valorizando a identidade local e a excelência técnica como diferencial competitivo.
Ela atua diretamente com comunidades garimpeiras, artesãos e pequenos empreendedores locais, promovendo capacitações em temas como economia solidária, organização produtiva e práticas sustentáveis. “Queremos que a riqueza da opala beneficie toda a comunidade de Pedro II, e não apenas um pequeno grupo”, completa.
A preocupação não é infundada. O acúmulo de rejeitos da extração mineral — em especial, quando mal destinados — pode causar danos severos, como vimos nos desastres ambientais de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais. Embora em menor escala, Pedro II enfrenta um problema grave resultante do acúmulo dos rejeitos em áreas de garimpo e entorno urbano, especialmente nas proximidades de nascentes e rios.
Mas há uma luz no fim do túnel — e ela vem da ciência e da economia circular.
Pesquisadores discentes dos Programas de Mestrados Profissionais em Engenharia de Materiais e Processos Industriais (PPGEM) e o de Análise e Planejamento Espacial (MAPEPROF), ambos do IFPI, orientados pelo prof. Dr. Érico Rodrigues Gomes, propõem uma solução inovadora: transformar esses rejeitos em rochas artificiais aglomeradas e argamassas, com aplicação direta na construção civil, podendo serem usadas para pavimentação, revestimentos e artefatos de uso urbano ou como remineralizadores de solos na agricultura sustentável. Estes produtos, além de reduzirem o impacto ambiental, poderão gerar empregos e renda, agregando valor ao que antes era descartado, ao mesmo tempo em que se pensa a recuperação ambiental das áreas degradadas pela mineração.
A ideia é reaproveitar o que seria rejeitos e resíduos minerais para criar produtos úteis, duráveis e sustentáveis, mostrando que é possível conciliar extração com sustentabilidade ambiental. Trata-se de uma estratégia que promove a economia circular, fecha ciclos produtivos e fortalece a ideia de que cuidar do meio ambiente também é uma forma de enriquecer uma região — de forma justa e duradoura.
UM MERCADO AINDA A SER DESBRAVADO
A pesar de sua qualidade incomparável, a opala piauiense ainda é pouco conhecida internacionalmente. Boa parte da produção vai para o mercado interno ou é vendida para atravessadores a preços muito abaixo do seu real valor. Faltam estrutura, certificação, marketing e apoio à exportação.
Segundo os pesquisadores do APL, a organização da cadeia produtiva pode multiplicar os ganhos da cidade e do estado, elevando Pedro II a um novo patamar no mercado gemológico mundial. Com investimento em tecnologia, rastreabilidade, capacitação e divulgação internacional, a opala pode, enfim, conquistar o reconhecimento que merece.
Mas essa caminhada rumo ao mercado global começou há décadas, impulsionada por pioneiros que enxergaram na opala não só beleza, mas potencial econômico e cultural. Um dos nomes mais emblemáticos dessa história é Bené do Tucum, também conhecido como “Bené, o Rei das Opalas”.
Bené começou de forma simples, produzindo alianças com sementes de tucum, uma palmeira da região. Mas foi ao conhecer os mestres joalheiros Onofre e José Renato, em Pedro II, que se encantou pela opala. A partir daí, uniu sua habilidade com o tucum ao brilho da pedra preciosa — criando biojóias únicas, originais e cheias de identidade regional.
Não parou por aí. Bené se dedicou ao ofício da lapidação, desenvolvendo suas próprias técnicas e acumulando experiência também como garimpeiro. Seu talento o levou a participar, ainda em 1999, de missões internacionais nos Estados Unidos e em Hong Kong, representando o Brasil e levando a opala piauiense ao conhecimento de joalheiros e compradores estrangeiros.
“A opala de Pedro II tem uma dureza rara. Algumas podem ser esculpidas com fogo, outras exigem cola fria, porque não resistem. E a nossa, além do brilho, tem uma resistência que impressiona”, conta Bené.
Hoje, Pedro II é considerado um polo regional de joias — e muito disso se deve ao trabalho de pioneiros como ele. Bené continua na cidade, agora também atuando no setor de hotelaria, acolhendo turistas e compradores curiosos sobre a origem daquela pedra que muda de cor com a luz, junto com seu filho, que seguiu seus passos.
Sua história mostra que o mercado da opala não é feito só de cifras, mas também de gente, paixão, coragem e criatividade. E que, com estrutura e apoio, a cidade pode ir muito além: do sertão do Piauí para o mundo.
LAPIDAR O FUTURO
A história da opala de Pedro II está apenas começando. Com o trabalho conjunto de cientistas, artesãos, educadores, empresários e instituições públicas, a cidade pode se tornar referência mundial — não apenas em beleza, mas também em inovação, sustentabilidade e inclusão produtiva.
Afinal, o brilho da opala piauiense é muito mais do que um espetáculo visual. É uma oportunidade concreta de transformar vidas, territórios e o próprio futuro do Piauí.
E ninguém entende isso melhor do que Juscelino Araújo, lapidador e joalheiro, fundador da Opalas Pedro II, uma das primeiras empresas do ramo na cidade. Juscelino começou sua jornada em 1987, quando participou de um curso de lapidação promovido pelo governo do estado, focado no aproveitamento de rejeitos minerais. Foi lá que ele teve o primeiro contato com as opalas — e nunca mais largou.
Na época, Pedro II ainda não tinha produção de joias. As opalas eram vendidas em estado bruto, muitas vezes a preços irrisórios. Juscelino começou lapidando e comercializando, enquanto sua esposa, Áurea Brandão, se dedicava ao trabalho de design, unindo criatividade e identidade local às peças. Com o tempo — e com a chegada dos Festivais de Inverno, que movimentaram o turismo e a cultura da cidade — a arte foi ganhando corpo, espaço e mercado.
“Quando comecei, não existia joalheria com opala aqui. Fui um dos primeiros. Hoje a cidade já é conhecida como polo, e isso é motivo de orgulho”, afirma Juscelino.
Em 1992, ele fundou sua empresa, Opalas Pedro II, que se tornou referência na fabricação de joias com opalas brasileiras. Para ele, o reconhecimento internacional está a caminho — e será impulsionado, principalmente, pelo trabalho do APL da Opala, que tem promovido pesquisa, certificação, capacitação e internacionalização.
“A opala piauiense se destaca por sua dureza e pela intensidade do brilho. Entre as opalas nobres e brancas, a de Pedro II é uma das mais raras e desejadas. As minerações até hoje foram quase todas na superfície. Em profundidade, os depósitos são maiores, profetiza. “Tem muito a ser descoberto ainda.”
Com uma visão empreendedora e compromisso com a valorização da opala, Juscelino representou o estado do Piauí na Tucson Gem Fair 2025, a maior feira internacional de joias e pedras preciosas do mundo, realizada anualmente entre janeiro e fevereiro nos Estados Unidos. Com o apoio do APL através da FAPEPI e da SEPLAN, ele levou suas criações a um público exigente — e saiu de lá com novos contatos, clientes e boas perspectivas para todos da Associação de Joalheiros e Lapidários de Pedro II, AJOLP.
“Tive compradores da Austrália interessados. Mas percebi que ainda pouca gente conhece a opala brasileira. O mercado é muito profissionalizado, e os consumidores desconhecem a origem da nossa pedra. A certificação e a divulgação são essenciais. Com elas, a opala de Pedro II vai ganhar expressão e importância global.”
Histórias como a de Juscelino e de tantos outros pioneiros, Pedro II vai deixando de ser apenas terra da opala, para se tornar símbolo de inovação mineral, identidade cultural e desenvolvimento sustentável. E, ao que tudo indica, o futuro está mesmo pronto para ser lapidado.
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