As olimpíadas de conhecimento têm-se estabelecido como fortes aliadas na popularização da ciência, e mais, têm sido responsáveis por garantir sonhos para vários alunos da rede pública
O incentivo e as descobertas de novos talentos no Brasil através das Olimpíadas Científicas já é um fato consumado. No Piauí, os destaques são tantos que ganharam holofotes nacionais. A maneira como as Olimpíadas realmente favorecem estes alavanques tão significativos tem sido inspiração para várias pesquisas, afinal, são muitas as histórias de sucesso que acontecem nas mais diversas regiões do Estado.
É o caso de Ryan da Silva, de apenas 14 anos, medalhista de ouro na Olimpíada Brasileira de Astronomia e Aeronáutica (OBA). Para o garoto, o resultado na competição lhe abriu novos horizontes, fazendo com que percebesse o quanto poderia evoluir no caminho rumo à pesquisa e à ciência. “Foi muito importante esse contato porque eu estudei mais, tive oportunidade de aprender coisas novas e ter outras experiências”, afirma.
Natural do município de Água Branca, Ryan é um dos muitos alunos da rede municipal da cidade que estão listados em resultados de olimpíadas como medalhistas ou agraciados com menções honrosas. Só na edição da OBA em 2019 o município conquistou 224 medalhas ao todo, sendo 133 de ouro, 50 de prata e 41 de bronze. E o resultado não fica só na OBA, mas em várias outras competições científicas das quais o município faz parte.
Ryan, bem como os outros 223 medalhistas da OBA no município, conseguiram ver no resultado e nas medalhas que ganharam uma outra perspectiva de vida. É graças ao papel motivador das olimpíadas que alunos de regiões interioranas do país têm-se sentido motivados à ingressarem no campo das ciências. O próprio Ryan garante que desde que recebeu o resultado algo mudou dentro de si.
“O conhecimento que tenho adquirido foi muito importante para mim. Coisas que eu não conhecia. Ganhar essa medalha foi muito importante, minha primeira medalha mas que me fez perceber o quanto é importante se dedicar. Participar das olimpíadas me mostrou que podemos buscar conhecimento de várias formas, conseguir mais conhecimento lendo na internet. Me encheu de vontade de pesquisar e conhecer ainda mais coisas”, afirma.
Olimpíadas de conhecimento e suas oportunidades
As chances que Ryan tem hoje de fazer uma universidade, segundo ele mesmo, são muito maiores. E não é o caso isolado do garoto, mas de vários outros medalhistas que ao longo dos últimos anos têm se destacado e redescoberto uma ciência ainda mais empolgante e uma vontade pelo conhecimento que acaba formando psicólogos, professores, médicos, advogados, jornalistas e tantos outros profissionais que tiveram seus primeiros contatos com uma nova dimensão de Ciência enquanto faziam provas das competições.
Para o professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI) e coordenador nacional da Olimpíada Nacional de Ciência (ONC), Jean Antunes Catapreta, não é segredo o avanço do conhecimento científico entre os jovens, bem como da popularização da ciência, como resultado da aplicação das olimpíadas de conhecimento.
“A capacidade de nossos alunos tem avançado muito com as olimpíadas. Todas elas contam com histórias de sucesso. Existe hoje no Brasil 32 olimpíadas de conhecimento. E esses resultados que os alunos têm nestas competições, faz com que eles sejam tratados como heróis nas suas cidades”, afirma o professor.
Catapreta também defende que as premiações causam uma competição sadia, que acaba fazendo com que mais alunos queiram participar e mais resultados positivos venham a acontecer. “Os alunos premiados são vistos de uma outra maneira, se destacam, e isso serve de motivação para que mais alunos se dediquem por resultados parecidos”, completa.
O mesmo pensa o diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), Marcelo Viana que, em entrevista à Agência Brasil, destacou a importância que tem as olimpíadas quando garantem maiores oportunidades para os alunos que tenham se destacado nas competições.
“Uma olimpíada abre portas profissionais para os estudantes premiados, amplia os conhecimentos, mas é muito mais que isso. Você pega um município pequeno, onde as oportunidades são limitadas, e um estudante consegue uma bolsa em uma escola em outro município, ou continua seus estudos, são transformações extraordinárias”, destaca Viana.
O professor João Xavier da Cruz Neto, pró-reitor de Pesquisa e Inovação da UFPI e ex-coordenador nacional de Olimpíadas de Matemática destaca que há histórias que servem de exemplo e que demonstram o real impacto das competições nas vidas dos estudantes pelo Brasil afora.
“Tem um depoimento recente que eu acho muito interessante: a Tábata Amaral disse que quem abriu o mundo para ela foi a OBMEP [Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas], porque ela se saiu muito bem, ganhou medalha de ouro numa edição e um colégio muito conhecido de São Paulo ofereceu uma bolsa e condições para ela estudar. Ela acabou indo estudar nos Estados Unidos e tudo mudou na vida dela”, conta Xavier.
Além do despertar intelectual provocado pelas provas, e do impacto disso na vida dos estudantes, outras oportunidades também podem ser destacadas, como o incentivo financeiro destinado através de bolsas de iniciação científicas, muitas das quais têm sido ofertadas através da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Piauí (Fapepi) a alunos de vários municípios do estado, garantindo uma renda extra que possibilita maiores investimentos na educação.
Neste ano, 15 alunos do Piauí foram até a Bahia para receberem suas medalhas de ouro na OBMEP. Destes, dez são oriundos de escolas públicas, sendo que oito deles vêm da cidade de Cocal dos Alves, município brasileiro proporcionalmente mais premiado na Olimpíada. Alunos da rede municipal de Oeiras e de Teresina também foram premiados.
Os resultados da cidade de Cocal dos Alves, no norte do estado, sempre estão à frente no Brasil. Entre 2005 e 2018, o município coleciona mais de 370 premiações, entre medalhas e menções honrosas nesta competição. Ao todo, já foram 41 medalhas de ouro para alunos cocalalvenses.
O mestrando em matemática, Márcio Brito, ex-aluno medalhista do município afirma que a experiência no município foi um passo importante para sua carreira. Sem o contato que as olimpíadas lhe proporcionaram, ele assegura, talvez não tivesse tido força de vontade suficiente.
“Eu fui para um curso de preparação para realização de uma prova de olimpíada e aquilo abriu meus horizontes. Foi onde vi que eu poderia ir mais fundo, me dedicar mais, e consegui colocar na minha cabeça que eu poderia me esforçar para fazer parte daquele universo”, afirma, mostrando o quão transformadora foi a participação em olimpíadas para o seu crescimento acadêmico.
Popularizando a Ciência através das olimpíadas
As olimpíadas científicas são consideradas momentos privilegiados para a popularização, divulgação e educação científica, devido entre outros à descoberta e ao incentivo de novos talentos nas diversas áreas das ciências, principalmente para estudantes da rede pública de ensino no Brasil.
Segundo o professor João Xavier, um dos objetivos centrais da popularização da ciência é garantir que os estudantes da educação básica tenham o lampejo científico em mente, possibilitando uma estrada à frente como pesquisador. “Um dos objetivos principais é atingir uma população da educação básica, fazendo eles perceberem que há uma carreira acadêmica, científica e que fazer ciência é importante para o mundo, é fundamental”, garante.
Xavier destaca ainda a importância de que os alunos façam as olimpíadas, uma vez que elas dão uma nova dimensão de ciência e fazem com que os participantes abram suas percepções e tenham chances de estabelecer um contato com o mundo cada vez mais amplo e com significados mais profundos.
“Não existe uma coisa pior que a ignorância de conhecimento. Uma pessoa sem conhecimento está no papel de refém. Mas a partir do momento que ela sabe o porquê das coisas, ninguém mais faz ela de boba. Quando a Ciência leva o aluno a uma verdadeira compreensão de mundo, ele se sente um verdadeiro cidadão. Uma pessoa participante da sociedade, entendendo o que está acontecendo”, completa.
ONC e Piauí no pioneirismo das olimpíadas
A relação do Piauí com olimpíadas científicas rende histórias já faz um bom tempo. Afinal, partiu daqui a iniciativa para a consolidação de algumas das mais importantes Olimpíadas do país.
“Foi uma junção da experiência já existente, principalmente no Ceará, que é anterior a nossa mas, acompanhada da nossa, que deu o modelo da prova da OBMEP, que inicialmente era apenas uma prova para descobrir talentos”, conta o professor João Xavier.
Além da OBMEP, a Olimpíada Nacional de Ciências (ONC) também é quase piauiense. Ela nasceu como um projeto de extensão da Universidade Federal do Piauí (UFPI) e passou a ser um programa da Universidade, uma vez que com o crescimento da visibilidade vários estados têm feito projetos para se vincularem ao Programa.
“A ONC tem sido recebida de maneira maravilhosa nas escolas. Porque ela não é só Química, só Física, só Biologia ou só Astronomia. Cada questão que o aluno vai resolver, ela cobra várias temas. As questões são interdisciplinares, então para resolver aquele desafio o aluno tem que saber daquelas áreas. E isto está de acordo com a BNCC [Base Nacional Curricular Comum] que está começando a vigorar”,coloca Jean Catapreta, coordenador nacional da ONC e professor da UFPI.
Mais de 1,9 milhão de estudantes participaram da ONC este ano, oriundos de mais de 2,4 mil municípios, incluindo um do Japão. Mas o interessante mesmo, segundo o professor, é que cada aluno se deparou com uma prova que carrega a assinatura da UFPI. “É um feito grandioso para a Universidade. Cada prova divulga a instituição e alunos do Brasil inteiro, e até do Japão, veem esse destaque da UFPI”, finaliza.
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